Assinatura do Desejo

Na casa dos vinte eu tinha tempo para cortejar mulheres na Internet e o mercado fetichista parecia uma cidade pequena. Não existiam Tinder nem OnlyFans — só fóruns, boards e chats madrugada adentro. Não era fácil, mas era viável, e estar solteiro significava poder mostrar o rosto sem pensar duas vezes.
Dos fóruns às feeds monetizadas#
Duas décadas depois tudo soa comercial. Dominação escorregou para a mesma categoria de Netflix ou Photoshop: assinatura, serviço, produto. Findom virou paradigma, e os lugares que antes pareciam comunitários — FetLife, Twitter — viraram outdoors. Na primeira geração das redes a amizade era a lógica: você adicionava alguém, a pessoa te adicionava de volta. Hoje tudo roda em torno de seguidores. Eu percorro as personas; elas nunca me veem.
Fazendo as contas do desejo#
Então fiz as contas. Se quero a intimidade e a tensão que me mantêm vivo, preciso contratar garotas que construam kink no próprio ofício. A honestidade de uma troca explícita é mais limpa do que implorar migalhas no feed. Tenho quarenta anos, estou estável, confortável. Gastar nessas experiências mal arranha minha vida — a não ser quando me esbaldo em uma sessão extrema que me deixa em brasa por dias.
Por um tempo tentei deixar as acompanhantes BDSM de lado. A COVID destruiu os eventos de que eu dependia, e o que sobrou ficou mais “profis$ional”, polido a ponto de esfriar. No meio dessa virada conheci minha noiva. Ela é a pessoa com quem vejo um futuro, mesmo sem habitar o arquétipo de dominatrix promíscua que continua beliscando minhas fantasias.
Negociando amor e compra#
Esse contraste é o motivo desta confissão. Vivo entre gerações: um pé na teia crua e mútua do meu passado, outro nas economias reluzentes do kink atual. Ainda estou aprendendo a dizer para a mulher que amo que eu quero as duas coisas — a calma dela e a queimadura transacional que primeiro me ensinou quem eu era.